Vereador propõe que Curitiba faça laqueadura e vasectomia na população em situação de rua
Medida semelhante fez com que o estado de São Paulo pagasse indenizações de R$ 100 mil a mulheres em situação de vulnerabilidade
Curitiba pode passar a fazer laqueadura e vasectomia, métodos contraceptivos por cirurgia, na população em situação de rua. A proposta, que será enviada em ofício pela Câmara Municipal de Curitiba, foi idealizada pelo vereador Eder Borges (PL).
O texto prevê que sejam submetidos à vasectomia e à laqueadura aqueles que não aceitarem um tratamento de desintoxicação ou uma reinserção social. Borges justifica a medida, descrevendo que homens e mulheres em situação de rua não têm condições de responder pela responsabilidade civil.
E, ainda, afirma que “cientificamente já é demonstrado, as sequelas aos nascituros, advindas por uso de substâncias psicoativas pelos genitores são praticamente irreversíveis”. Na sequência, emenda que, em sua maioria, os recém-nascidos que são filhos de pessoas em situação de rua são, em sua maioria, submetidos à adoção ou a outras situações drásticas — sem detalhar.
No texto, o vereador não cita as fontes que embasaram a justificativa para propor que Curitiba submeta as pessoas em situação de rua a cirurgias contraceptivas, como vasectomia e laqueadura.
O vereador defendeu a proposta, que, segundo ele, poupa crianças de uma vida terrível. “Porque nós sabemos que, pessoas que já nascem de pessoas viciadas em crack, já nascem com dependência química e com uma série de transtornos terríveis. Basta andar pelas ruas de Curitiba para nós vermos quantas crianças estão em uma situação indigna, pedindo esmola. E o que acontece com estas crianças? Vão para lares (de adoção), são criadas sem família e sem afeto”, afirmou.
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Ele descreve, no entanto, que a medida não deve ser compulsória — situação inconstitucional. E sim, que seja sugerido às mulheres e aos homens em situação de rua, como uma opção para tratamento.
A vereadora Professora Josete (PT) afirmou que essa proposição é uma ameaça a autonomia das pessoas em situação de rua.
“Esta proposta vai contra os preceitos da Constituição Federal. No seu artigo 3º, inciso 3º, que trata do direito à dignidade humana, o Estado não pode estabelecer políticas que refiram qualquer pessoa de ter a sua autonomia. E aqui, o que precisamos é ampliar políticas, por exemplo, como o consultório de rua. Isso é função do consultório de rua. Acompanhar as mulheres em situação de rua e determinar ações, cumprir com políticas públicas, no sentido também de evitar uma gravidez. Mas isso não significa obrigar”.
O projeto também recebeu críticas de Dalton Borba (PDT): “o projeto não tem fundamento jurídico, não tem fundamento histórico, não tem conteúdo. É um projeto nazista, que discrimina. Uma sugestão [ao Executivo] que visa introduzir métodos contraceptivos em homens e mulheres em situação de rua… É um atentado à vida humana. Tratar pessoas em situação de rua como se fossem cães, que devem ser castrados. Eu acho que essa sugestão deveria ser encaminhada para essa vertente política, que prega esse ódio”.
Curitiba oferece métodos contraceptivos de maneira gratuita
Em Curitiba, as mulheres em situação de vulnerabilidade social podem receber gratuitamente um método contraceptivo implantado. O contraceptivo é colocado sob a pele da paciente, como um chip, e libera hormônios que bloqueiam a ovulação. No Paraná, 1,3 mil procedimentos do tipo foram realizados em seis anos.
Laqueadura compulsória fez o estado de São Paulo pagar indenização de R$ 100 mil a uma mulher vulnerável
No Brasil, a esterilização compulsória é inconstitucional. Em 2022, uma mulher em situação de vulnerabilidade foi submetida a uma laqueadura compulsória, a partir de um pedido do Ministério Público de São Paulo.
Na ocasião, a mulher tinha um quadro de dependência química e era mãe de cinco filhos. O pedido do MPSP foi deferido e ela foi submetida ao procedimento contraceptivo.
Na sequência, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) reverteu a decisão — mas a laqueadura já havia sido feita. Por esse motivo, o estado de São Paulo foi condenado em R$ 100 mil. O juiz Renato Augusto Pereira Maia, que autorizou a indenização, descreveu, na época, que o caso representava um “inadmissível preconceito social contra pessoas pobres”.
E justificou que “Ignorar a autonomia individual neste particular, mediante práticas forçadas, significaria dar à pessoa humana um tratamento de coisificação, oposto, portanto, ao da dignificação”. Clique aqui para mais detalhes.
Em 2018, um caso semelhante também fez com que o TJSP fosse condenado em um mesmo valor. Na época, a mulher submetida à laqueadura compulsória era presidiária e mãe de oito filhos. A Prefeitura de Mococa, que foi obrigada a realizar o procedimento, chegou a entrar com uma ação para reverter o caso, mas não obteve êxito. Clique aqui para mais detalhes.
*Com informações de Câmara Municipal de Curitiba, Instituto Brasileiro de Direito de Família e Brenda Niewiorowski | BandNews FM Curitiba
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