Contrários ao programa Parceiro da Escola são intimidados nos locais de votação, diz deputada
Secretaria de Estado da Educação admitiu pedir reforço à Polícia Militar nos espaços onde a consulta pública acontece
A consulta pública para definir o destino das escolas paranaenses começou com ameaças de prisão, intimidações, truculência policial e tentativas de direcionamento de voto, denuncia a deputada estadual Ana Júlia (PT). Entre hoje (6) e a próxima segunda-feira (9), comunidades de 177 colégios estaduais decidirão se vão ou não aderir ao programa Parceiro da Escola — que prevê a privatização da administração dos colégios estaduais.
De acordo com o Governo do Paraná, até o fim da tarde desta sexta-feira (6), foram computados 13,5 mil votos. 100 mil pessoas ligadas à comunidade escolar, de 98 municípios, podem opinar sobre a implementação do programa Parceiro da Escola.
No Colégio Estadual Ivo Leão, em Curitiba, duas denúncias foram registradas. Em uma delas a diretora tentou desmotivar estudantes a votar. Um grupo de alunos estava se direcionando ao local de votação, quando a diretora interrompeu o trajeto de duas das alunas: “ela parou perguntando se a gente ia votar. A gente falou que sim e ela falou que não valia à pena votar, porque não era coisa importante. Mas, que se fosse para votar, era para votar sim”, relatou uma aluna, que não quis se identificar, à deputada.
Outro caso envolveu a advogada Marilda Ribeiro e a Polícia Militar. A advogada afirma que acompanha a votação desde o início e que, neste tempo, conversou com a direção da escola e também com os integrantes da mesa que recebem os votos. Em um dado momento, uma viatura da Polícia Militar, transportando um sargento e um soldado, chega ao local. Os agentes afirmaram que foram até lá após um pedido da Secretaria de Estado de Educação (SEED).
De acordo com Marilda, os policiais conversaram com o responsável de um dos estudantes, que estava no local para votar. Ele apresentou aos policiais uma mensagem no celular, com um informativo da SEED sobre os dias e os horários da consulta pública. “Eu perguntei a esse responsável se a mensagem da Secretaria de Educação era apenas informando sobre o processo ou se estaria pedindo votos”, afirmou a advogada. O responsável mostrou a ela a mensagem e confirmou que o informativo enviado pela SEED continha informações sobre o programa.
“Imediatamente, o policial se sentiu ofendido, afirmando que eu intervi numa conversa privada entre eles e dizendo que eu estava provocando conflito no espaço de votação”, relatou. A advogada discordou, reafirmando que o interesse da pergunta era saber se a SEED estava usando a máquina pública para pedir votos favoráveis ao programa. “Isso gerou um descontentamento na Polícia Militar”, que registrou um boletim de ocorrência contra a advogada, relata a própria.
Nesse colégio em questão, os alunos com mais de 16 anos foram autorizados a votar na consulta pública, após uma liminar concedida na quinta-feira (5), pela 1ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba. A decisão foi da juíza Carolina Delduque Sennes Basso, a pedido do grêmio estudantil.
Uma manifestante contrária à aprovação do projeto contou à Ana Júlia ter sido ameaçada de prisão por um dos policiais militares que faziam a operação. À deputada, ela relatou, via WhatsApp: “recebi uma advertência verbal do policial. Se eu me manifestar, receberei voz de prisão“. A situação ocorreu no Colégio Estadual Dom Orione, também na capital paranaense.
No mesmo local, a assessoria parlamentar da deputada Ana Júlia (PT) afirma ter recebido, por parte da comunidade escolar, pedido de apoio jurídico pelas ameaças e confrontos com pessoas favoráveis ao programa. “A diretora estava cedendo estrutura física da escola, como cadeiras, para as pessoas que estavam do lado de fora fazendo campanha para o projeto do governo. Uma postura totalmente parcial e vedada, uma vez que se trata de patrimônio pública”, afirma a deputada.
Em nota, a SEED admitiu a solicitação de apoio da Polícia Militar para patrulhamento dos locais de votação. E afirma que fez o pedido após a denúncia, por parte de pais de alunos, de que professores e funcionários ligados a sindicatos estavam fazendo campanha nas escolas.
Outro ponto que causou discordância entre os manifestantes contrários ao programa Parceiro da Escola e o Governo do Paraná foi um documento enviado pela SEED sobre as diretrizes para garantir a segurança e o direito de votação durante as consultas públicas. No artigo 5 da Orientação N.º 3/2024 – DG/SEED, a Secretaria de Educação afirma: “não é permitido fixar ou distribuir materiais de propaganda, como cartazes ou panfletos, dentro da escola ou em sua área externa”.
No entanto, conforme defende a deputada Ana Júlia (PT), a SEED não tem autoridade para definir regras sobre manifestações no espaço externo das escolas. “Essa orientação configura tentativa de censura, e motivou uma atuação policial opressiva. Em alguns colégios, a PM exigiu a retirada de faixas e barracas. São ações ilegais e inconstitucionais, uma vez que a Constituição garante a liberdade de manifestação de pensamento, de expressão, de locomoção e de reunião em espaços públicos“, afirma a parlamentar.
Em defesa do direito à manifestação, a deputada afirma que continua acompanhando as votações e que oferecerá auxílio aos manifestantes, caso seja necessário. “Nossa assessoria jurídica e parlamentar está preparada para dar o suporte para as diferentes ocorrências, sempre em busca da lisura e transparência no processo das consultas”, garante.
Na tarde de ontem (5), a APP-Sindicato, que representa os professores e os funcionários das escolas públicas do Paraná, se declarou contra a aprovação do Programa Parceiro da escola.
“Nós temos um projeto envolto em dúvidas e questionamentos. Há uma medida cautelar do Tribunal de Contas fazendo uma série de questionamentos à Secretaria de Educação, sem respostas. As perguntas das comunidades escolares continuam sem respostas. O Tribunal de Justiça suspendeu partes do decreto. O Ministério Público também questiona o programa. Tantos questionamentos, tantas dúvidas e a Secretaria decide manter a consulta. Se está privatizando, com tantas dúvidas, com tanta falta de informação, é sinal de que a coisa não é boa”, declarou Walkiria Mazeto, presidente da entidade.
Entenda o programa Parceiro da Escola, do Governo do Paraná
O Governo do Paraná defende que o Programa Parceiro da Escola busca otimizar a gestão administrativa e de infraestrutura das escolas, com ações conjuntas com instituições especializadas em gestão educacional. Em resumo: o Governo Estadual, por meio da SEED, prevê a privatização do gerenciamento dos colégios estaduais.
O Governo do Paraná afirma que, com o programa, os diretores e os gestores das escolas poderão se concentrar na qualidade da gestão. E inovar no desenvolvimento de metodologias pedagógicas, no treinamento de professores e no acompanhamento do progresso dos alunos.
Para endossar o discurso favorável ao projeto, o Governo Estadual afirma que, desde 2023, o programa Parceiro da Escola é testado nos colégios estaduais Aníbal Khury, em Curitiba, e Anita Canet, em São José dos Pinhais, região metropolitana de Curitiba. As entidades parceiras são a Tom Educação e a Apogeu. Segundo o Governo, nas duas entidades os índices de matrículas, frequência e desempenho escolar apresentaram melhorias significativas entre 2023 e 2024.
Quais são os argumentos dos manifestantes contrários ao programa?
“As escolas precisam, sim, de mais recursos, mas a maneira de fazer isso é muito simples: é só repassar os recursos diretamente às instituições, por meio do Fundo Rotativo. Não precisa ter um intermediário, como quer o Parceiro da Escola, que vai ganhar muito mais do que hoje recebem os colégios, e ainda quase sem nenhuma contrapartida”, defende a deputada Ana Júlia (PT), que votou contra o projeto, enquanto tramitava na Assembleia Legislativa do Paraná.
A deputada explica que, enquanto os colégios públicos estaduais recebem um incentivo de R$ 10 por alunos, as empresas que administram os testes do programa receberam R$ 800 por aluno. “stamos falando de quase R$ 2 bilhões que serão repassados à iniciativa privada sem transparência e especificações necessárias”, detalha.
A deputada acredita que “a privatização sucateia a educação pública, pois interfere na autonomia pedagógica das escolas”. E que, com o programa, as empresas poderão contratar professores pela modalidade CLT, dispensando a exigência de concurso para lecionar nos colégios estaduais. Se isso se materializar, os professores deixarão de ter segurança para atuação em sala de aula, sob a chance de serem demitidos, inclusive por questões políticas, a qualquer momento. “Afinal, o que as empresas querem não é qualidade de ensino, mas apenas lucro”, conclui.
Por esse motivo, desde a aprovação da privatização da administração dos colégios estaduais de Curitiba, a deputada afirma ter atuado politicamente e juridicamente, denunciando ilegalidades do programa. Entre as ações estão: o envio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) e o pedido de suspensão do programa, ao Tribunal de Contas Estadual (TCE). Essas ações foram tomadas porque a deputada, assim como outros membros da oposição na Alep, defendem que o projeto é inconstitucional, uma vez que a gestão da educação pública compete ao estado.
“Seguiremos denunciando as ilegalidades e atentos ao processo de consulta, tomando as medidas judiciais cabíveis”, afirma.
Como denunciar excessos durante a votação da consulta pública para execução do programa Parceiro da Escola?
Os manifestantes que se sentirem coagidos durante a votação da consulta pública para viabilizar o programa Parceiro da Escola podem denunciar os excessos à equipe da deputada. As denúncias devem ser enviadas via WhatsApp, pelo número: (41) 99285-2969.
Veja na íntegra a nota da Secretaria de Estado da Educação sobre as denúncias das ações da Polícia Militar nos locais de votação do programa Parceiro da Escola
A Secretaria de Estado da Educação trabalha desde o começo da manhã para que o processo de votação do Parceiro da Escola seja democrático, transparente e respeite a resolução que instituiu as regras gerais do pleito. A pasta recebeu relatos de pais dizendo que professores e funcionários ligados a sindicatos estavam fazendo campanha nas escolas e solicitou que todos os atos, favoráveis ou contrários, fossem realizados fora do perímetro das escolas, garantindo a lisura da escolha. A manifestação nas redes sociais e fora dos ambientes de votação é livre e saudável. O Núcleo Regional da Educação de Curitiba solicitou apoio da Polícia Militar apenas para patrulhamento dos locais de votação.
A equipe do Paraná Portal entrou em contato com a assessoria de comunicação da Polícia Militar do Paraná para questionar o suposto uso do efetivo para coação de manifestantes e vai atualizar o espaço assim que receber o retorno.
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