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Despesas com estacionamento pesam no bolso dos curitibanos
Foto: CSB

Despesas com estacionamento pesam no bolso dos curitibanos

A regra é clara: quanto mais perto do anel central, mais caro fica

Caroline Signori Berticelli - segunda-feira, 5 de agosto de 2024 - 14:26

Quem precisa ir ao centro de Curitiba com o carro próprio já sabe: obrigatoriamente irá gastar com estacionamento. Seja rotativo, seja privado, não há escapatória. Para quem trabalha na região, a situação é ainda pior, a única alternativa é arcar com um gasto significativo, que pesa no bolso e ajuda o salário a encolher. 

Os preços mudam conforme a localização e geralmente variam entre R$ 14 a 15 a hora, R$ 20 a 50 a diária e a partir de R$ 240 para deixar o veículo em horário comercial durante um mês. A regra é clara: quanto mais perto do anel central, mais caro fica

Quem se dispõe a pagar explica que a opção do transporte público não atende suas necessidades ou então atende de forma insatisfatória. Todos consideram a despesa alta, mas admitem que acabam abrindo mão de outras coisas para ter um pouco de conforto. 

Ereni Aparecida Pinheiro, secretária executiva, mora em São José dos Pinhais e todos os meses precisa desembolsar R$ 240 para deixar o carro estacionado mais R$ 350 de combustível. “Trabalho no centro há 15 anos e por muitos anos vim de transporte coletivo, é preciso pegar de três a quatro ônibus. É muito sofrido, a gente perde muito tempo, eu chegava em casa às 19h30. Sem contar que eles estão sempre lotados, atrasam. Eu chegava atrasada quase todo dia mesmo saindo cedo de casa”, conta. 

A analista financeira Renata Lopes Malinovski, mãe de dois filhos, fez o caminho inverso, e passou a utilizar o transporte público há cerca de um ano, depois que os custos com estacionamento e combustível ultrapassaram seu teto de gastos. Desde então, sua rotina ficou muito mais corrida. Morando no bairro Sítio Cercado, ela pega três ônibus para chegar no centro e três para voltar para casa

“Eu tenho que sair bem antes de casa. Preciso fazer toda uma logística com meus filhos. Eu saio de carro, deixo um na escola e deixo o outro na casa da minha avó no Sítio Cercado, onde também fica o meu carro. Dali eu saio para pegar o primeiro ônibus, chego no terminal pego o Ligeirão Norte Sul e na Sete de Setembro finalmente pego o último ônibus, que me deixa próximo ao trabalho”, explica. 

Segundo Renata, em dias de muita chuva e frio, ela se dá ao luxo de ir de carro e paga apenas pela diária. Esses dias, no entanto, devem ser escolhidos a dedo. Do contrário, deixam um rombo no seu orçamento

Já seu colega Paulo Henrique Nicoletti Basso, mora no Ahú e paga mensalmente R$ 260 para deixar o carro em um estacionamento no centro de Curitiba, depois de pesquisar e não encontrar nenhum lugar mais em conta. “É caro. A gente não tem opção e os preços perto do meu trabalho não variam muito. Eu pago no estacionamento mais ou menos o preço que eu gastaria para vir de ônibus, mas ainda têm o combustível e o desgaste do veículo”, fala.

Paulo afirma que o valor gasto em estacionamento é “economizado com o tempo perdido”:

“De ônibus eu vou demorar de 40 a 50 minutos, sendo que de carro chego em 15 minutos. Do lugar onde eu moro, o ônibus para vir mais perto do trabalho passa a cada 1h10. A outra opção é andar cerca de 20 minutos para pegar outras linhas que passam com mais frequência, mas para mim é longe. Seria muito melhor vir de ônibus, mas essas questões do tempo perdido e ter que se deslocar muito a pé são complicadas”. 

Impacto financeiro e qualidade de vida 

O economista e professor Daniel Poit destaca que qualquer prejuízo para quem ganha até quatro salários mínimos impacta o orçamento familiar de forma considerável. Principalmente, porque o salário desse trabalhador já tem uma carga alta de descontos: 

“Vamos imaginar uma pessoa que tenha um salário líquido em torno de R$ 3 mil, com os descontos de INSS, talvez uma assistência médica, mais o Imposto de Renda. Para ela, qualquer R$ 100 é muito representativo, quando a gente fala em R$ 3 mil, 10% são R$ 300. Então se a pessoa gasta R$ 200 em uma mensalidade de estacionamento, mais cerca de R$ 400, R$ 500 em combustível. Já é mais de 20% só no item transporte, sem considerar outros custos como IPVA, depreciação do veículo, seguro, etc”.

O profissional pontua que esse valor poderia ser economizado se os sistemas de transporte público fossem mais eficazes, ou seja, se oferecessem mais conforto, mais segurança e maior frequência na passagem das linhas de ônibus. 

“Infelizmente, o transporte público de Curitiba, que já foi modelo para o mundo, hoje está saturado e nenhum dos ganhos de produtividade que foram obtidos, por exemplo, com o aumento do tamanho dos ônibus, com a automação da cobrança da passagem (reduzindo o custo com o cobrador) foi repassado para tarifa. A tarifa ano ano, sistematicamente sobe acima do índice de inflação, e mais que isso, a prefeitura a cada ano aumenta o número o volume financeira de subsídios. O que faz com que o transporte seja, na verdade, de muito lucro para as empresas e custe cada vez mais para a sociedade”, diz o economista. 

Ainda conforme Daniel, é importante deixar claro que o custo do transporte impacta profundamente na qualidade de vida do trabalhador. Não apenas no sentido de poder comprar mais bens, de ter acesso a mais ou menos itens de conforto, mas também no sentido de que o tempo gasto no transporte impede de que o trabalhador tenha mais lazer, a possibilidade de praticar esportes, de estudar, de se qualificar mais, participar de mais formação ou mesmo conviver com seus familiares

“O maior prejuízo, na minha opinião, no que diz respeito ao transporte é essa perda de qualidade de vida quando se gasta muito tempo com transporte. E ela se agrava com a perda de qualidade de vida por ter parte de seu orçamento comprometido com os gastos de transporte”, finaliza. 

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Os valores cobrados nos estacionamentos de Curitiba são mais caros no centro. (Foto: CSB)

As observações do economista vão ao encontro das dificuldades enfrentadas pelos três entrevistados. Ereni, por exemplo, afirma nem cogitar a possibilidade de voltar a usar o transporte coletivo para se locomover entre a casa e o trabalho

“Eu passo por um monte de ônibus sempre lotados, pode ter dez, mas os dez estão lotados, às vezes quebrados. Eu fico pensando nas pessoas cansadas, que trabalharam o dia todo e ainda isso. É caro para mim, mas além de ser mais rápido e tranquilo, também é mais seguro, porque ainda tem a questão dos assaltos em pontos de ônibus”, diz a secretária executiva.

Mais de mil estacionamentos em Curitiba 

Existem mais de mil estacionamentos em toda a capital, sendo 272 só na região central, onde o IPTU e o aluguel impulsionam os valores cobrados. Apesar desses fatores justificarem os preços, é nítido que há um certo abuso pautado na lei da oferta e procura

É válido ressaltar, no entanto, que enquanto grandes empresas têm lucros altos, pequenos empreendedores lutam para que seus negócios sobrevivam. Situação que segue a velha e esmagadora lógica do mercado. 

Anderson Buzeti, por exemplo, é sócio do irmão em um estacionamento localizado na Rua Nunes Machado, próximo ao Shopping Curitiba. O terreno de 360 m2 é alugado por R$ 3.623 e eles pagam R$ 13.860 de IPTU ao ano. “Só o aluguel e o IPTU somam mais de R$ 5 mil, mais o salário do meu sócio que toca o negócio a maior parte do tempo, ISS e contador, todo mês iniciamos com quase R$ 8 mil de contas”, afirma. 

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Os valores para estacionar no local são R$10,00 a hora, R$ 20,00 a diária ou R$ 200,00 por mês. Anderson, que tem o estacionamento como uma segunda fonte de renda, explica que no local não cabem muitos veículos e eles precisam dar prioridade para clientes rotativos. 

“O estacionamento comporta no máximo 26 carros, com isso os valores, principalmente dos horistas, precisam ser mais altos. Inclusive, a gente acaba pegando poucos mensalistas para ter um giro maior de clientes por hora e compensar manter o negócio”, conta. 

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