Oficiais militares ruins de ofício
“Improvável que na história da República ou antes o Exército brasileiro tenha sido submetido a tanto constrangimento e vergonha provocados pelas trapalhadas de seus oficiais, além da tentativa criminosa que cometeram de golpe fracassado de Estado”.
A SAFRA PROMETE
Parece cartesiano. Se o general de reserva Braga Netto, agora preso, recebeu de fato dinheiro do agronegócio em caixa de vinho e o repassou a criminosos fardados para assassinarem o presidente da República e ministro do STF, a colheita promete ser farta. Ou empresários do agronegócio deram dinheiro sabendo de causa específica, ou então os repasses eram coisas de rotina na dinâmica do governo.
ROTEIRO DE FILME PASTELÃO
Não fosse o crime imperdoável a que se propuseram, poderia ser roteiro de comédia pastelão o que esses militares do Exército protagonizaram com a tentativa de golpe de Estado, comandados pelo general de reserva Braga Netto como espécie de lugar-tenente de delinquências do então presidente da República. Agora se descobre que seu assessor na Casa Civil do então governo, capitão ou coronel de Exército em função subalterna enredado na tentativa do golpe, fez anotações conspiratórias de próprio punho em papel ofício já de posse e prova da Polícia Federal. Lula não sobe a rampa, fez questão de anotar de próprio punho o brioso e qualificado oficial do Exército Brasileiro. Antes dele, Mario Fernandes, coronel da ativa do Exército, monta cronograma com o passo-a-passo do golpe e arquiva em computador de seu gabinete no Palácio do Planalto. Houve ainda caso de um dos militares chamados Kids pretos faltar a uma reunião da conspiração porque não encontrou táxi para leva-lo. O próprio ex-presidente deixou em gaveta da escrivaninha na sede do seu partido texto em quatro laudas de discurso a ser feito com o golpe consumado. Também em mãos da Polícia Federal. E o agora presidiário general de reserva recebe caixa de vinho com dinheiro dentro para passar ao grupo daquele que não encontrou táxi. Nem a imaginação o de humor mais grotesco conseguiria supera-los. Brancaleones. Imaginem se estivessem em missão de alta espionagem ou em confrontos de uma guerra com suposto inimigo armado e preparado para mandar bala. Melhor nem imaginar.
AS ENTRELINHAS DO GENERAL
Não deixa de ser emblemática, pelas entrelinhas, até mesmo eventualmente involuntárias, a declaração do hoje senador e ex-vice presidente da República, general da reserva Hamilton Mourão, sobre a prisão de seu ex-colega de farda e de governo, ex-ministro e general Brega Nato, preso pela Policia Federal por obstrução de justiça no inquérito sobre a criminosa e fracassada tentativa de golpe de Estado. Declara, literalmente, que “o general Braga Netto não representa nenhum risco para a ordem pública“, e que a prisão seria o que considera um atropelo judicial. Usa o verbo representar no tempo presente, não se sabe se por ato falho ou propositado, ele não se refere ao pretérito, época em que ambos navegavam na nau dos insensatos, apesar de o ex-vice presidente ter se tornado espécie de figura indesejada nas rodas de conversas. Talvez seja apenas um problema de cognição do general senador, mas implica em sugestiva suspeição de que nada mais é como antes, o que é bem mais provável pelos indícios levantados pela Polícia Federal contra seu ex-colega. Não deixa de haver uma certa sinceridade, mesmo às avessas, como tem sido de hábito nessas convulsivas demonstrações intelectuais e de qualificação de nossos braços oficiais militares, na ativa ou de ceroulas.
Alceo Rizzi é jornalista, publicitário e escritor.