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Reino Unido: sistema de saúde que inspirou SUS perde £14,7 bilhões por ano com erros de atendimento

Reino Unido: sistema de saúde que inspirou SUS perde £14,7 bilhões por ano com erros de atendimento

De acordo com a NHS Confederation, um dos principais desafios enfrentados atualmente é a escassez de profissionais de saúde em diversas áreas, incluindo médicos, enfermeiros e fisioterapeutas

Lorena Nogaroli - segunda-feira, 16 de dezembro de 2024 - 12:45

Fonte de inspiração para o Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro, o Sistema Nacional de Saúde britânico (NHS) enfrenta uma dura realidade: gasta £14,7 bilhões (aproximadamente R$ 120 bilhões) por ano para tratar pacientes prejudicados por erros de atendimento, segundo o relatório National State of Patient Safety, elaborado pelo Instituto de Inovação em Saúde Global do Imperial College London em parceria com a organização Patient Safety Watch. O estudo, liderado pelo Prof. Lord Ara Darzi, ex-ministro da saúde e codiretor do Instituto de Inovação em Saúde Global, aponta um retrocesso significativo na segurança do paciente, com consequências graves em múltiplas frentes.

Darzi descreveu “declínios alarmantes” em 12 métricas-chave de segurança desde 2022. Entre os problemas destacados está o aumento de mortes evitáveis, que  hoje chegam a 820 por ano. O relatório também expõe disparidades regionais gritantes: os efeitos adversos do atendimento médico são duas vezes mais frequentes no nordeste da Inglaterra do que em Londres, uma preocupante divisão regional.

Escassez de pessoal e greves constantes

De acordo com a NHS Confederation, um dos principais desafios enfrentados atualmente é a escassez de profissionais de saúde em diversas áreas, incluindo médicos, enfermeiros e fisioterapeutas. Essa falta de pessoal sobrecarrega a força de trabalho existente, levando a maiores cargas de trabalho, esgotamento e comprometimento do atendimento ao paciente. Além disso, contribui para tempos de espera mais longos e acesso reduzido aos serviços de saúde.

O número de profissionais ativos foi afetado pelos baixos salários e greves no setor. Desde março de 2023, houve 44 dias de paralisações motivadas por disputas salariais e o subpagamento crônico levou muitos médicos a abandonar a profissão. Em julho de 2024, sob o novo governo trabalhista, um acordo concedendo aumento salarial de 22% foi aceito, encerrando as greves. O NHS também solicitou ao governo que dobre o número de vagas nas Faculdades de Medicina até 2030.

Erros mais comuns

Especialistas em indenização por acidentes da claims.co.uk analisaram dados do NHS de abril de 2015 a setembro de 2023 para identificar os erros médicos (Never Events) mais frequentes nos hospitais, e os períodos do ano em que ocorrem com maior frequência. Never Events, definidos pelo NHS como incidentes sérios e evitáveis, incluem 1.584 casos de cirurgias no local ou paciente errado, como amputações de dedos incorretos ou injeções no olho errado; 852 casos de objetos deixados no corpo após procedimentos, como algodão ou agulhas cirúrgicas; e 431 incidentes de implantes ou próteses erradas, como placas cranianas feitas para outros pacientes ou marcapassos inadequados.

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Outros erros registrados incluem 180 casos de administração de medicamentos pela via errada, como remédios orais aplicados por via subcutânea, e 159 ocorrências de sondas nasogástricas ou orogástricas mal posicionadas. Esses dados evidenciam a gravidade de falhas amplamente evitáveis que, se seguidos os procedimentos de segurança corretos, não deveriam ocorrer, ressaltando a necessidade de maior rigor e supervisão nos protocolos hospitalares.

Decisões judiciais

O relatório anual de 2023/24 da NHS Resolution destaca avanços na resolução de disputas, com 81% das reivindicações resolvidas sem processos judiciais, beneficiando mais de 10.800 pacientes e famílias por meio de métodos alternativos; além disso, iniciativas como o esquema de Notificação Antecipada aceleraram o acesso à compensação para necessidades urgentes, alinhando-se à estratégia de evitar tribunais e melhorar a segurança.

Enquanto isso, no Brasil…

Um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) revelou que os danos decorrentes da prestação de serviços de saúde são a principal causa de morte no Brasil, seguido de problemas cardiovasculares e câncer. Segundo o relatório, a cada três minutos, cerca de dois brasileiros morrem em hospitais devido a erros que poderiam ter sido evitados. Dados de 2020 publicados na revista The Lancet apontam cerca de 302 mil mortes anuais relacionadas a falhas médicas evitáveis no país.

Ao contrário do Reino Unido, judicialização da saúde no Brasil é um tema complexo e multifacetado, que desafia o sistema de saúde e as relações entre pacientes, médicos e o Poder Judiciário. Os dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostram que, somente em 2023, foram ajuizadas 565 mil ações sob o direito à saúde no Brasil – um aumento de 20% em relação ao ano de 2022.

De acordo com o professor de Direito Médico e da Saúde, Tertius Rebelo, os principais danos decorrentes da prestação de serviços de saúde no Brasil incluem falhas de diagnóstico e erros relacionados a medicamentos, tanto na prescrição quanto na administração, especialmente em aplicações endovenosas, em que a troca de medicamentos pode ser fatal. “Erros cirúrgicos também são comuns, ocorrendo quando há desvios ou falhas na técnica utilizada, fora do padrão esperado”, acrescenta Rebelo, que é também diretor do Instituto Miguel Kfouri Neto (IMKN).

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