
Sociólogo Jessé Souza lança novo livro ‘O Pobre de Direita: A Vingança dos Bastardos’ em Curitiba
O evento gratuito e aberto ao público acontece na segunda-feira (25)
O sociólogo Jessé Souza lança o seu novo livro ‘O Pobre de Direita. A Vingança dos Bastardos’ com uma palestra explicativa sobre a obra na manhã de segunda-feira (24) em Curitiba. O evento gratuito e aberto ao público acontece na Sala de Leituras da UniBrasil, às 9h.
A abordagem para o desenvolvimento da obra segue premissas de livros anteriores do autor como, por exemplo, a contraposição ao entendimento que se tornou hegemônico na autocompreensão do Brasil e dos brasileiros, em especial nos conceitos de homem-cordial e de patrimonialismo.
Souza acredita que considerar que o povo é incapaz de um agir racionalmente e atende apenas as suas emoções é uma forma elitizada de entender a atualidade. Por isso, seus livros são sempre baseados em análise teórica e pesquisa empírica com o objetivo de compreender de fato o que se passa na base da pirâmide social brasileira.
A obra‘O Pobre de Direita. A Vingança dos Bastardos’ aborda o fenômeno político recente que colocou na pauta o chamado “pobre de direita”. Para o sociólogo, o surgimento de pessoas de baixa renda com posição política de direita e/ou extrema-direita está ligado a humilhão constante que essas pessoas sofrem diariamente, com uma vida marcada por jornada de trabalho exaustiva, baixos salários, pouco tempo de lazer com a família e amigos etc.
O sociólogo afirma que esse estrato da sociedade foi atraído pelo discurso da direita que lhe ofereceu a condição moral da ‘honestidade’. Assim, ao se orgulhar por não ser um pobre delinquente, o pobre de direita recupara a autoconfiança e a autoestima.
Doutor em Sociologia pela Ruprecht-Karls-Universität Heidelberg , na Alemanha, e autor de best-sellers como A Ralé Brasileira e A Elite do Atraso, Souza é um dos mais importantes sociólogos brasileiros da atualidade.
Entrevista com Jessé Souza
Pobres viraram à direita porque religião os acolhe na humilhação, diz Jessé Souza
“O Pobre de Direita”, novo livro do sociólogo Jessé Souza, foi escrito antes das eleições municipais, mas é uma leitura útil para entender um fenômeno que se verificou nas urnas: a virada à direita do eleitor brasileiro, que se situa majoritariamente nas classes C, D e E da pirâmide social.
“Comecei a pesquisar o assunto porque as duas explicações que existiam não me satisfazem”, disse Souza à Folha em Lisboa, onde esteve para lançar seu livro. “A primeira é a do minion, do gado, que é o estereótipo do senso comum. A segunda resposta, mais acadêmica, é a de que o pobre tem uma cabeça conservadora por causa da religião, como se fosse uma coisa intrínseca a ele. A pergunta que ninguém fez é: por que a pessoa escolhe justamente aquela religião entre tantas possíveis?”
A hipótese de Souza, ancorada em dezenas de entrevistas que ocupam metade do livro, é que existe entre os brasileiros das classes populares uma necessidade de reconhecimento e autoestima. “Trata-se de alguém que é humilhado cotidianamente, tanto que a depressão e o alcoolismo são doenças recorrentes entre as classes populares. A religião evangélica traz isso para o pobre, ele deixa de ser humilhado e passa a ser ouvido.
Para Souza, esse é um fator de escolha de candidatos pouco explorado pelos cientistas políticos. “Existe uma moralidade, uma ética social compartilhada, não necessariamente articulada e consciente –aliás, quase nunca é articulada e consciente– que comanda o pensamento das pessoas.”
A ideia de que “as pessoas têm como razão última de sua ação social a dimensão moral”, como Souza escreve no livro, é retirada da obra do pensador alemão Georg Friedrich Hegel, principal referência filosófica do estudo.
Em sua pesquisa, Souza foi a campo em busca de brasileiros que votaram no ex-presidente Jair Bolsonaro em 2022. As entrevistas excluíram os ricos e a classe média –contingente que, em suas estimativas, soma 20% da população.
“Não peguei ninguém da classe média –a não ser da classe média descendente, que é muito importante, esse pessoal todo vota no Bolsonaro– porque são muito poucos, não elegem ninguém. Quem ganha a eleição são os outros 80%. São esses que você precisa explicar.”
Para isso, Souza recorre a um recorte regional e racial, baseado num mergulho em dados do censo. “A situação do negro pobre é muito pior que a do branco pobre. É como se o branco pobre estivesse com água até o pescoço, e o negro estivesse com o rosto todo dentro da água. É aí que a igreja evangélica pega, puxa pelos cabelos e diz, ‘respira, irmão'”, afirma.
“O negro no Brasil sabe que tem uma polícia que vai persegui-lo, que ele pode ser morto a troco de nada à noite. É uma situação muito pior que a do branco pobre.”
Grande parte desses eleitores votava na esquerda no passado e agora vota na direita. O que mudou? “Quando existia a Teologia da Libertação, houve um encontro no PT entre a organização de massas trabalhadoras –de modo autônomo pela primeira vez no país–, mas ao mesmo tempo com uma linguagem que chegava ao pobre através da Igreja Católica.”
“A concepção liberal da sociedade é parecida com a concepção marxista no sentido de que se preocupam principalmente com questões materiais”, afirma o sociólogo. “Não veem que a vida moral, a vida simbólica, pode ser o dado mais importante.”
Para Souza, há outras formas de atingir esses eleitores sem recorrer à religiosidade. “Getúlio Vargas, por exemplo, tinha uma mensagem política de valorização da dignidade do povo. O problema não é apenas que a esquerda atual não sabe fazer isso. Minha impressão é que nem estão tentando.”
*POR JOÃO GABRIEL DE LIMA, VIA FOLHAPRESS
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