Como fazer telefonema mudo
“Do jeito que a coisa anda na telefonia móvel, com a chamada agência reguladora que a nada regula, vamos acabar aos moldes dos índios do velho oeste americano. Só como por meio de sinais de fumaça, como faziam os apaches”
Um dos tiros pela culatra, de distorção talvez mais perversa, dentre tantas outras, desde a instituição da chamada Nova República iniciada ao término do período da ditadura militar no País, foi essa iniciativa no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso FHC, com seu modelo neoliberal, de criar as chamadas agências reguladoras dos serviços, à exemplo da telefonia, energia, saúde, etc e etc. O que, em tese, na visão do liberalismo efeagaciano, era para excluir e eximir o governo da regulamentação dessa gama de serviços e afastar eventuais manipulações e outros interesses que não fossem necessariamente públicos, acabou funcionando como um bumerangue. Deixou o Estado praticamente de mãos atadas para interferir nos abusos que acontecem na prestação desses serviços e na transformação de instrumentos meramente de interesses que beiram à delinquência propositada das empresas fornecedoras das tais agências reguladoras. Estão elas hoje de tal forma distanciadas do interesse público, em espécie que se assemelha a de associação com as empresas fornecedoras de serviços, de tal ordem que o que se pretendia evitar, a manipulação, parece ter se transformado em pedra angular. Elas não existem a favor do interesse dos consumidores e se alguém tem alguma dívida ou argumento para demonstrar o contrário, que tente se empenhar nesta luta inglória.
O descaso está em toda a parte e é de se supor que não se restrinja apenas a determinados Estados, como acontece escandalosamente no Paraná. Se alguém tiver dúvida, que olhe sobre a fronteira e veja o apagão de energia que acontece com frequência no Estado de São Paulo deixando a população às escuras e prejuízos incalculáveis. A propósito do que houve lá, com a concessionária de energia sendo privatizada, neste caso a conversa furada sobre necessidade de um Estado Mínimo deixa de existir, e o governo é obrigado a direcionar recursos públicos da ordem de 1 bilhão de reais para financiar a recuperação de estragos havidos de comerciantes em geral. Agora, o que acontece na área de telefonia móvel é de criminoso escárnio, inaceitável abuso das prestadoras do serviço e um criminoso silêncio de leniência e espécie de consentimento à desordem estabelecida, ao contrário do que deveria ser. Não há uma ligação que se faça de um celular para outro que não seja inexoravelmente interrompida, obrigando ao usuários fazerem nova chamada, em alguns casos repetidas vezes, para concluir ou iniciar uma conversa. É um milagre quando isso não acontece. Ou então, com a chamada permanecendo, só com o detalhe de que apenas um dos interlocutores consegue fala, o usuário do outro lado escuta mas não é ouvido na outra ponta da linha. E o que acontece não é de agora, não é recente. E onde está a Anatel, a agência reguladora do serviço para colocar paradeiro nessa esbórnia lucrativa em que se transformou a telefonia móvel para as empresas prestadoras, que não investem em infraestruturas para suportar a venda de telefones e outras coisas?? Ganha um celular, última geração quem achar que não seja isso o que ocorre. Se o aparelho vai funcionar, conseguir fazer ligação, aí já são outros quinhentos, é pedir demais.
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As agências reguladoras criadas lá atrás, poderiam até ser consideradas como instrumentos para modernização dos serviços e do aparelho do Estado, não fosse a cultura política do País. Ela não está interessada neste aspecto segundo avaliam alguns cientistas da área, parlamentares estão empenhados, em primeira ordem, a atender seus próprios interesses, o resto que se exploda, diria o personagem de humor, mau caráter e guru, Alberto Roberto. Essa relação incestuosa entre agências reguladoras e empresas prestadoras de serviços parece estar se banalizando de tal forma a ponto de se tornar fator de normalidade. E também parece que já nem há mais preocupação em dissimular e as agências se empenharem em tentar demonstrar, com algumas eventuais exceções, para que vieram. Fazem o que querem e o que bem entendem. Fazem como naquele velho samba: “nosso amor é tão bonito, ela finge que me ama e eu finjo que acredito”, e assim vão vivendo de amor. Em anos recente, por exemplo, um ex-chefe de gabinete de um deputado líder da bancada da área de saúde privada, parlamentar influente em vários governos, foi nomeado chefe da Agência reguladora de Saúde Suplementar, que cuida dos planos de saúde. Precisa mais??
Alceo Rizzi é jornalista, publicitário e escritor.