O Brasil voa de jatinho em “sinergia com o futuro”. Não é piada.
“Não é à toa que muitas vezes tem gente que questiona para que serve de fato o Senado da República com esse modelo, considerado anacrônico, de sistema legislativo bicameral que nada teria a ver com Democracia. Em Portugal, por exemplo, não existe”.
O episódio da última semana, em que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, requisita um jatinho da Força Aérea Brasileira (FAB) para levá-lo à Roma, para dar palestra em um evento empresarial, não espantaria apenas pela atitude, quando existem ofertas de voos diários e normais de companhias aéreas para aquele país, nas quais poderia embarcarem primeira classe, mas até, talvez por ato falho ou por trapaças de algum irônico desígnio, o tema escolhido por ele para falar aos estrangeiros seja bem sugestivo ao que se passa na política brasileira: “sinergia com o futuro”. É o tema da palestra!! Não é piada!! É sério!!. Deve estar de fato o nobre senador e presidente da mais alta Câmara do Legislativo do País a se fiar que seja esta uma grande missão a se prestar, motivo suficiente para que o País não fique em desassombro com a mordomia, que soa a todos como acintosa e debochada, às expensas do dinheiro do contribuinte, com custo de jatinho exponencialmente superior ao de qualquer passagem aérea. Quem sabe até acima do custo por todo o espaço que um avião dispõe para assentos em primeira classe, que ele bem poderia, talvez, arrendar e viajar com exclusividade, junto com os seus. Mas a FAB também existe para isso, motivo pelo qual incluiu em seu périplo transatlântico o colega, antecessor e seu candidato eventual à sucessão, o senador David Alcolumbre.
Nada de ilegal, ainda que moralmente se questione. Não é por menos ou mais, ou por menores ou maiores motivos, que se questiona para que serve o Senado Federal da República em um sistema legislativo bicameral anacrônico para muitos, sem razão de existir. Em tese, para funcionar como Câmara revisora de decisões da primeira instância legislativa, mas que na prática nada mais seria de que depósito de antigas lideranças políticas, cujas contribuições ao país se esgotaram ou se é que um dia tenha sido dadas. Embora ocorra na maioria dos países do dito mundo ocidental, exceção de Portugal e até mesmo de Israel, a existência do Senado teria sido uma cópia adotada do modelo dos EUA e da França, segundo analistas, não para servir necessariamente para a Democracia como regime legislativo, mas para abrigar integrantes da aristocracia e do clero, que à época se sentiram excluídos, uma compensação que se adotou como regra.
Segundo dados disponíveis, dos cerca de 170 legislativos existentes no mundo, apenas 1/3 é bicameral. Mas, nem mesmo assim, na maioria desses países, o sistema Legislativo bicameral é tão dispendioso e com custos tão elevados como o Congresso brasileiro, do qual o senador embarcado no jatinho requisitado da FAB é seu presidente. O Congresso Nacional brasileiro é o segundo mais dispendioso, oneroso e gastador do planeta, superado apenas pelo Congresso dos Estados Unidos, e nisso nem se leva em conta as facilidades para se ter serviços à lá-carte de jatinhos, de outras prebendas, mordomias e jabotis com que nossos bravos parlamentares são agraciados. Melhor nem sequer mencionar ou comparar parâmetros de desempenho, aptidões, qualificação, produção, etc…e etc…. Estudos realizados por pesquisadores de universidades americanas e da Universidade de Brasília (UNB), mostram que o. gasto com cada congressista do Brasil, corresponde a 528 vezes à renda média dos brasileiros, ante uma proporção de 228 vezes nos Estados Unidos, país mais pobre que nosso, como é de amplo conhecimento. Somos líder absoluto neste quesito.
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Dados recentes mostram que cada um dos senadores representa custo superior a 600 mil reais por mês, algo acima dos 7 milhões de reais por ano. Um dinheiro que, para muitos, poderia ser melhor aplicado. E não se trata de seu alimentar neurônios febris e distúrbios cognitivos, em cujas safras o País tem se mostrado pródigo nos últimos anos, pela supressão da racionalidade. Faz parte, espera-se sanitariamente por isso que passe logo. Mas, diante da impossibilidade de extinguir o Senado, como muitos desejariam, sem síndromes de neurônios febris, não seria ruim, talvez, se ao menos copiasse ou se assemelhasse à Câmara dos Lordes, da Inglaterra. Com integrantes nomeados, em parte por hereditariedade, outros não. Mas sem poderes, como espécie de rainha ou agora de rei da Inglaterra. Sem quitutes, rapapés, jatinhos ou prebendas às custas do contribuinte de forma tão escrachada,acintosa, abusiva e debochada. À propósito, ganha um pirulito quem souber, de pronto, na ponta da língua, citar os nomes dos três senadores eleitos de seu estado, no caso os do Paraná também. Leva uma caixa da guloseima se souber informar sobre uma medida sequer que tenham sugerido ou conseguido aprovar. E a justificar a função que em tese exercem, com estrutura de 50 assessores, fora moradias gratuitas e outras prebendas.
*Alceo Rizzi é jornalista, publicitário e escritor.