Coluna Alceo Rizzi
De cabeça de juiz e de bunda de neném
Foto: Freepik

De cabeça de juiz e de bunda de neném

“Se fosse na vigência do Código de Hamurabi, na lei de Talião, a do Olho por Olho, Dente Por Dente, dá para imaginar a esbórnia que seria“.

Alceo Rizzi - segunda-feira, 30 de setembro de 2024 - 11:17

A impressão, a cada dia que passa, é de que parece  não haver qualquer contestação àquele dito popular, o de que de cabeça de juiz e de bunda de neném a gente nunca sabe o que vem,  sem que se faça aqui qualquer desmerecimento a quem quer que seja. É apenas citação de um dito. 

      Mas, também, a cada dia que passa, parece que fica cada vez mais distante aquela pretensa convicção, ou fé verdadeira que há anos havia, de se confiar cegamente nas decisões da Justiça, porque tudo se tornou tão confuso, embaralhado,  e às vezes surpreendente, que ao dito popular já se poderia  até adicionar reparo,  acrescentar que já não há tanto mistério assim: que já se sabe o material que sai de ambas as fontes. No caso, com forte prevalência e predomínio de território dos recém-nascidos, em  essência e aroma. 

       Injustiça ao recém-nascidos ainda sem domínios de suas faculdades mentais e  que se emprestam a personagens do ditado. O que também acontece a cada dia que passa, além da geleia, é a severa suspeição e desconfiança de que há sempre algo que se assemelha quando alguém sob investigação, sob fortes indícios delinquentes, professa inocência e diz confiar na Justiça

      Fato é que esse vai e vem de expedição de mandados de prisão, com personagens trancafiados ou sob a ameaça de, para logo em seguida haver sua  revogação ou anulação, em decisões tomadas por distintos juízes, desembargadores ou ministros do judiciário, não contribuem para que se desfaça essa impressão negativa, de verdadeira bagunça conceitual

      Cada um interpreta a lei como quer e bem entende, elas servem apenas como esteio ou pano de fundo a seus desejos, no caso a quem compete decidir,  sem que pareça haver entendimento ao que elas estabelecem ipisis-literis. O que, por consequência, faz lembrar um blague ás avessas de um outro dito popular e que originalmente se utiliza como espécie de consolo diante de infortúnios. Na distorção, o de que a Justiça tarda e também falha.

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       Daria até para enumerar exemplos, o mais recente a decisão da juíza do Estado de Pernambuco que determinou a prisão de um desses cantores de gênero musical sertanojo, com determinação de apreensão de seu passaporte, sem que se entre no mérito ou estabelecer juízo de valor  sobre ela, se procede ou não judicialmente. No dia seguinte, desembargador de Justiça do mesmo estado determina revogação da decisão da juíza e anulação da apreensão de passaportes, sem falar no vai-e-vem do prende e solta de uma tal de influenciadora digital, em ambos os casos sib suspeição de operações de lavagem de dinheiro do crime organizado através de jogos online.

       Diante do que se passa e pelos mesmos critérios, fosse vigência do Código de Hamurabi, o primeiro conjunto de leis de conhecimento da História Humana, estabelecido pelo rei da Suméria de mesmo nome há  quase dois mil anos antes de Cristo,  dá até para imaginar o tamanho da esbórnia. A principal lei do Código de Hamurabi era a Lei de Talião, pela qual se punia criminosos com a mesma pena do crime por ele cometido, no “Olho por Olho, Dente por Dente”. 

      Pelo menos não deveria ser coisa confusa e desacreditada. 

      E até poderia valer outro dito: em terra de cego quem tem um olho é rei. 

Alceo Rizzi é jornalista, publicitário e escritor

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